O relógio já entrara na contagem regressiva do prazo que o governo dispunha para aprovar o Orçamento de 2012, que se esgotaria à meia-noite de 22 de dezembro, quando o senador Valdir Raup disse a lideranças sindicais de servidores e aposentados que o vice-presidente da República, Michel Temer, se comprometia a se envolver pessoalmente nas negociações com a presidenta Dilma Rousseff para ajudar a atender às reivindicações destes setores.
O comunicado com jeito de apelo foi feito na reunião entre parlamentares, lideranças partidárias e representantes dos trabalhadores que ocorreu em meio à sessão conjunta do Congresso Nacional naquele tenso fim de noite, recorda o servidor Antonio Melquíades, o Melqui, diretor da Fenajufe (Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e do MPU) e do sindicato de São Paulo (Sintrajud). Raup tentava convencer o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) a abrir mão de um requerimento explosivo: a verificação de quórum que derrubaria a sessão e impediria a aprovação de um orçamento que excluía os projetos salariais dos servidores do Judiciário e do MPU e o aumento real para os aposentados do INSS que recebiam acima do mínimo.
O apelo do senador, que é de Rondônia e preside nacionalmente o PMDB, não convenceu servidores ou aposentados, observa Melqui, mas acabou costurando o acordo entre os parlamentares que levaria à aprovação do Orçamento por um Congresso já às moscas. As lideranças parlamentares, porém, se comprometeram a se empenhar pela abertura efetiva de negociações com o governo.
No dia 28 de março último, uma quarta-feira de marcha do funcionalismo em Brasília, um grupo de servidores, a maioria da delegação do Sintrajud que participava do ato nacional, se reuniu com Raup no Senado para lembrá-lo dessa história e reivindicar o cumprimento de uma promessa que, mais de três meses depois, não resultou em qualquer ação concreta.
"Fomos até ele cobrar o compromisso assumido e ele concordou com tudo, [reconheceu] a promessa do Michel Temer e ficou de marcar uma reunião com o vice-presidente," relata Melqui. Isso, segundo o senador disse aos servidores, poderia ocorrer às vésperas do feriado da Semana Santa, o que não aconteceu, ou logo depois.
Dívidas e inflação
O coordenador da Fenajufe Saulo Arcangeli, que assim como vários dirigentes do Sintrajud também participou da conversa com o presidente do PMDB, destaca a urgência de tencionar para que o reajuste e o fim do congelamento entrem em pauta na capital federal. “Hoje, boa parte do salários dos trabalhadores é para pagar dívidas e isso está piorando”, assinala, enfatizando que a inflação não pára de corroer as remunerações da categoria.
A pressão sobre os parlamentares é parte de uma articulação que buscar forçar a abertura de negociações. E isso inclui a tentativa de já procurar os futuros presidente do STF, Ayres Britto, e do TSE, Cármen Lúcia. E pressionar a Comissão de Finanças e Tributação da Câmara a votar o projeto que revisa o plano de cargos e salários, o PL 6613/2009, que ali hiberna há um ano e dez meses.
Reuniões com Cármen Lúcia e Ayres Britto
Alguns dias antes da conversa com Raup, dirigentes da federação estiveram com a ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, que em abril assumirá a presidência do Tribunal Superior Eleitoral. Solicitaram a ela apoio na luta pela aprovação da revisão do PCS, mas a ministra também foi alertada para a possível greve a que a manutenção do congelamento pode levar. “Estamos caminhando para o sétimo ano sem reajuste, não dá para aguentar isso”, disse Melqui. Ele destacou ainda o fato de o governo não cumprir a lei nem a Constituição Federal, que prevê a revisão anual dos salários, atropelar a autonomia entre os Poderes da República e, depois, recorrer ao próprio Judiciário para criminalizar greves de servidores com os quais ele se recusa a negociar. Cármen Lúcia se mostrou preocupada com a possibilidade de greve e disse que faria o possível para buscar uma saída negociada com o governo.
Os dirigentes sindicais também já procuram o ministro Carlos Ayres Britto, que sucederá Cezar Peluso no STF, e que prefere só se pronunciar após assumir a presidência do tribunal, o que está marcado para o dia 19 de abril. Antes disso, nesta quarta-feira (11), a pressão será sobre a Comissão de Finanças, cujos deputados podem votar o PL 6613. O projeto está na pauta. A possível votação não tem ligação, até aqui, com nenhum acordo com o Planalto, que veta a proposta. "O governo segue com sua política de congelamento salarial, que precisa ser derrubada com a mobilização da categoria e a campanha unificada dos servidores." observou Saulo Arcangeli.
A eventual aprovação na CFT supera mais uma etapa na tramitação no projeto, mas está longe do final dessa luta. "Para isso, é preciso forçar o acordo entre o Executivo e o Judiciário. Precisamos de muita, muita mobilização para que isso aconteça," alerta Adilson Rodrigues, dirigente do Sintrajud e ex-diretor da Fenajufe, que vê a necessidade de pressionar o governo, os tribunais e o Congresso bem antes das eleições municipais de outubro.