14/9/2011


DO SINTRAJUD-SP

Projeto do governo desmonta Previdência Social dos servidores públicos

Além de acabar com a aposentadoria integral de novos servidores, PL 1992 mira espinha dorsal da previdência pública dos servidores; Bancos já disputam fundos de pensão de estados e municípios


 “Vamos esquecer na nossa gente, que trabalhou honestamente a vida inteira, e agora não tem mais direito a nada”. A frase é do Renato Russo, líder da Legião Urbana, morto em 1996, vitimado pela AIDS. Aqueles que cresceram ouvindo a sua poesia, durante os anos 1990, poderão sentir na pela o tom profético de suas palavras.

Trabalhar uma vida toda, contribuir com o sistema previdenciário e não saber quanto receberá. Essa é a lógica prevista pelo PL 1992/07, que foi aprovado no final de agosto na Comissão de Trabalho e Serviço Público da Câmara, e precisa passar por outras duas comissões, depois pelo Senado e seguir para a sanção presidencial.

O PL limita a aposentadoria dos servidores ao teto do benefício pago pelo INSS: R$ 3.691,74. Quem quiser receber mais, precisará aderir a um fundo de pensão; o FUNPRESP, que será criado com o 1992/07, caso ele se torne lei.

Na opinião de Maria Lúcia Fattorelli, Auditoria da Receita Federal aposentada, e coordenadora do Movimento Auditoria Cidadã da Dívida, o PL 1992/07 representa imenso risco aos servidores, “dada a insegurança quanto ao valor do benefício a que terá direito no futuro, pois a modalidade única prevista é a de Contribuição Definida mediante a qual os servidores saberão quanto terão que pagar, mas o benefício futuro dependerá do mercado. A afirmação está no artigo Riscos do Projeto de Lei 1992/07, Face à Crise Financeira Mundial.

Ela explica que o art. 11 do referido PL estabelece que a responsabilidade do Estado “será restrita ao pagamento e à transferência de contribuições ao FUNPRESP. Em outras palavras, se algo funcionar errado com o FUNPRESP; se este adquirir papéis podres ou enfrentar qualquer revés, não haverá responsabilidade para a União, suas autarquias ou fundações”.

Numa situação de crise econômica, em que grandes empresas e renomados bancos estão indo à falência, seria um risco muito grande entregar o futuro das aposentadorias nas mãos do “Mercado”.

Em outro artigo, intitulado A Falência Mundial dos Fundos de Pensão, o professor Osvaldo Coggiola alerta que a tendência mundial do capitalismo é reduzir a seguridade social a um benefício universal básico “e que qualquer benefício acima seja coberto diretamente pelo trabalhador, com contribuições obrigatórias ou voluntárias para companhias ou fundos privados”. Em sua opinião, o que se pretende, é “reduzir a aposentadoria estatal de modo a diminuir o gasto em aposentadorias e aumentar os pagamentos da dívida do Estado”.

Segundo Fattorelli, este é um dos principais motivos para que a Previdência Social venha sendo alvo de ferrenhos ataques por parte do setor financeiro nacional e internacional: “o objetivo evidente... é apropriar-se dos recursos que ainda são destinados à Seguridade Social para destiná-los aos juros. Daí os falaciosos discursos “déficit da previdência, necessidade de novas reformas e privatização”, afirma em seu artigo.

No Brasil, embora o pagamento de juros e amortizações da dívida pública consuma a maior fatia do Produto Interno Bruto (PIB) - em 2010 foram 44,93% -, essa dívida não para de crescer. Todas as demais áreas, por outro lado, têm seus orçamentos cada vez mais enxutos, com recursos próximos de zero, portanto, com quase nenhuma margem de manobra para desvios.

Fattorelli rebate o argumento daqueles que afirmam que mercado pode apresentar bons resultados: “No Brasil, a Resolução nº 26/08 do Conselho de Gestão de Previdência Complementar (CGPC), do Ministério da Previdência Social, determina que parte de eventuais superávits dos Fundos de Pensão sejam transferidos à entidade patrocinadora”.

No caso específico da PREVI (Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco Do Brasil) - que mantém o posto de maior fundo de pensão da América Latina, com patrimônio de US$ 92 bilhões apurado ao final de 2010 – “esta Resolução já permitiu ao Banco do Brasil a apropriação de bilhões de reais que deveriam ser destinados às reservas garantidoras dos futuros aposentados”, afirma Fattorelli, destacando que pela lei 9.530/1997, os lucros do BB distribuídos ao Governo Federal são obrigatoriamente destinados ao pagamento da dívida pública.

Bancos disputam Fundos de Pensão de Estados e Municípios

Reportagem publicada pelo jornal Valor Econômico no dia 09 de setembro revela a concorrência entre os bancos pelos fundos de pensão de Estados e Municípios: “a estimativa do secretário de Políticas de Previdência Social, Leonardo Rolim Guimarães, é de que os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS), como são chamados esses institutos, já teriam aplicados cerca de R$ 55 bilhões em julho, o que significa um crescimento de 188% em relação aos R$ 19,1 bilhões do final de 2004. Para os próximos cinco anos, a expectativa de Guimarães é de que o volume supere os R$ 100 bilhões”, afirma o texto.

A reportagem diz que esses números têm crescido de forma vigorosa nos últimos anos, fazendo com que bancos como BB, Caixa, Itaú e o HSBC busquem captar recursos com esses fundos. O HSBC, por exemplo, “captou R$ 155 milhões no semestre e administra cerca R$ 1,1 bilhão em recursos de RPPS. O banco considera o mercado de RPPS mais promissor agora do que o de fundos de pensão de empresas. Há uma curva muito mais crescente para o RPPS do que para os fundos de pensão, que são um mercado maduro, diz Phylipe Corsini. Segundo o Ministério da Previdência, o total de recursos de previdência de Estados e municípios saiu de 23,8 bilhões de reais em 2006, para 52,0 bilhões em 2010.

Na opinião de Washington Moura Lima, coordenador do Departamento Econômico do Sintrajud, o que está ocorrendo é a busca para que sejam transferidos mais recursos da esfera produtiva para o mercado financeiro. Quando isso ocorre, “aumenta-se a especulação financeira. Entregando o futuro dos servidores públicos nas mãos da especulação”.

Segundo explica, a especulação criar uma espécie de círculo vicioso. “Uma ação que custa um real, só manterá esse preço se mais recursos forem captados, justamente porque as ações que estão sendo negociadas não têm relação com a produção real”, explica. Ele ainda diz que essa artificialidade empurra, cada vez mais, a sociedade para a barbárie, porque, mesmo que toda Seguridade Social seja desmantelada, jogando os trabalhadores no limbo das incertezas do mercado, não há recursos para saldar a bolha especulativa que se criou.


Hélcio Duarte Filho
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